quarta-feira, 27 de abril de 2011

O Mistério do Afitim de João Preto.

Semana passada uma mãe amiga me parou pra falar do afitim - em baianês, quer dizer fedor - que tava no filho dela. Dava banho e nada. Já estava pensando em desodorante, vai que era adolescência? Perguntei se era castrado, se andava comendo o que não devia. Aonde, comer o que não presta?A mãe é mais maluca que eu e o moleque tava nos conformes. Sei porque fui visitar.

Tou bem na sala com ela, conversando, pondo papo em dia quando ele aparece, todo se rindo e se querendo. Catou-se nas minhas pernas e eu não resisto, fui pegar no colo. 

Minha Mãe Menininha do Gantois! O que foi aquilo? O menino afabava a siri podre! Já empesteada,  azoada do susto que meu nariz tomou, corri com felino e mãe correndo atrás na direção da porta. Só deu tempo dela pegar a chave do carro.

- Vamos aonde, criatura? - me pergunta ela.
- Mulher, se teu filho não tá com coisa muito séria, então é da clínica pra um terreiro ali na Baixa que é tiro e queda. Vamos e vamos logo!

A bicha me chora o caminho todo. Chegamos na clínica, veterinária boa mesmo, conhecia o mandrião já de outras alas, pegou a ficha. Leva pra ultrassom, leva pra lá, leva pra cá, espera fazer cocô, leva pro laboratório, espera fazer xixi, tira sangue e a hora comendo ali. Cochilei no sofazinho redondinha que só eu, meio apoiada na mãe que me nanou gostoso contando do abafa que teve na rua,  pela sétima vez - que ela contou, que baiano não faz a mesma briga duas vezes.

Umas 12 horas depois - sem sacanagem - vem a veterinária. 

- Ôxe, a criatura tem nada não.

E eu pensando? Como assim nada não, senhora? Fede que faz peste! E a médica parece que leu pensamento.

- Olhe, lavamos aqui e ele faz 12 horas que não cheira não. Em casa volta o afitim logo, é?

Voltava. Em pelo menos 4 horas. Minha amiga pagou, meteu o filho no sling dele e tocamos pra casa. De manhã, empesteado como se tivesse vindo do inferno. Não me conformei. Lavamos e trancamos ele num quarto. De noite, cheiroso bom que só. Fomos dormir.

Só que eu sou desconfiada. Tocaiei ali na cozinha e não deu outra: duas da matina e o pilantra passa macio, macio. Pula a veneziana e vai pro quintal.  Mesmo assim, ali não tem coisa que cheire desse jeito - pensei. Nessa que pensei, ele sumiu no escuro.

Fui pé ante pé atrás. Quintal enorme, casa antiga. Cheguei no barracão e comecei mesmo a sentir um cheiro esquisito. Assuntei firme e ouvi uns cleque cleques vindos de dentro do barracão lá do fundo. - Mas que diacho é isso? - já meio que me borrando, porque não acredito no outro mundo, mas vai que tem e resolveu dar o ar da graça justo hoje? Porta trancada, um breu de assustar preto velho e eu ali. Mas aonde tá João Preto?

Creundeuspai! Mas olhe que eu tava de pensar e o coisa ruim vir me atazanar o juízo! Do pensar me passa uma coisa branca pelo meio das pernas - porque o João Preto é branco feito lençol - a porta range e entreabre e na confusão eu me desequilibro e caio em cima dela, que cede. Um esporro do cão, luz acende na casa Tia Maria Eugênia, larga essa espingarda e liga pra polícia! Vizinho já na varanda, e eu no meio de qualquer coisa que cheira como meia de alguém que andou o Mercado Modelo todo com um peixe no sapato.  Levantava, escorregava e caía. Quando de pé fiquei, já tinha uma póca de gente na porta, meio me ajudando, meio rindo.

E minha amiga, pro funcionário dela: -Ô Jubiá! Pra que essa montanha de casca de siri guardada aqui, homem?
Ele, desasnado: - Ah, Dona Antônia, era pra fazer artesanato!
-E precisava guardar isso tudo? Vai abrir fábrica, é?
Larguei a discussão pra lá e tirei uma reta na direção do banheiro, largando roupa pelo meio da cozinha sob os olhares abestados de Dona Maria Eugênia, tia avó quase centenária da minha amiga, que ainda tinha a arma na mão. Ela me olha como se nada fosse uma mulher quase pelada, fedendo a caranguejo ali na cozinha dela e me diz:

- Ôxe, menina Anna. Cate a roupa não que eu vou pegar com o cabo da vassoura e pôr no cloro. Entre no banho que levo uma água de cheiro que isso vai sair assim por nada, não.

Do lado de Tia Geninha, João lambia a pata. Catei o infeliz.

- Tem água de cheiro pra dois, vamos embora!

Nem miou no banho. Nem pra água de cheiro. E minha amiga fez o funcionário dela dar um jeito naquilo, pra tristeza de João Preto, que toda noite se refastelava nos restos e no cheiro do caranguejo.

5 comentários:

ReCriando disse...

Ahahahahahahahahahahahaha!!!! Adorei!!!!!!!!!!!!

Beijos,

Marilia disse...

ADOREI!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

A. disse...

Isso não é nada...acho que essa semana só vou contar causo felino...:)

Gloria disse...

Gato ainda não tinha visto fazer isso, só cachorro. Tive um Pointer Ingles, sangue de caçador, que fugia e quando voltava era pra vomitar. As vezes vinha verde de bosta de cavalo/vaca, outros encontrava carniça e lá vinha o infeliz, mais podre que defunto desenterrado.O pior foi o dia em que ele encontrou fezes humanas. E o vet dizia que era normal, pois como caçador, ele fazia isso pra disfarçar o proprio cheiro, mil vezes eca! Bjs

Cecilia disse...

Ótima história!